Manifesto Contra o PLP 12/2024: Por um Trabalho com Direitos na Era Digital
Nós, pesquisadores, especialistas em direitos sociais e do trabalho e parlamentares comprometidos com a classe trabalhadora, nos posicionamos veementemente contra o Projeto de Lei Complementar no 12, de 2024, proposto pelo governo federal. Este projeto, ao contrário de avançar na proteção dos direitos dos trabalhadores/as uberizados, acaba por perpetuar e institucionalizar as formas de intensa exploração presentes nesta atividade economia, ao criar uma nova categoria de trabalhadores/as.
O PLP 12/2024, ao definir motoristas de aplicativos como “trabalhadores autônomos por plataforma”, não apenas ignora a realidade da relação de trabalho e subordinação existente entre as grandes plataformas digitais e seus trabalhadores/as, mas legitima uma precarização sem precedentes. Este projeto, sob a pretensão de regulamentar o trabalho uberizado às novidades tecnológicas, promove, na verdade, uma legitimação jurídica de práticas laborais que exacerbam a vulnerabilidade, a exploração e a desproteção completa dos direitos do trabalho.
A falsa autonomia promovida pelo PLP ignora deliberadamente a desigualdade estrutural de poder entre trabalhadores/as e plataformas digitais, que são submetidos a jornadas de trabalho extenuantes e sem garantias de remuneração justa pelo tempo disponibilizado, uma vez que seu tempo de espera é completamente desconsiderado. Dentre seus tantos equívocos e destruições de direitos, o PL propõe uma jornada de até 12 horas diárias, rompendo com o limite legal de 44 horas semanais, legalizando um precedente inaceitável, uma vez que 12 horas por dia, em 7 dias da semana, como é frequente nesta categoria, pode levar a trabalhar até 84 horas semanais.
Inclusive, caso os trabalhadores/as estejam subordinados a mais de uma plataforma, não haverá limite agregado de horas trabalhada. Assim, a proposição desta modalidade de trabalho como categoria “autônoma”, desconsidera a evidente subordinação econômica e tecnológica que caracteriza a atividade desses motoristas, comandada por algoritmos, gerando uma realidade de trabalho cujo funcionamento se baseia na “gamificação”, isto é, no atendimento sequencial de chamadas que se sucedem continuamente, mantendo uma intensa competitividade entre motoristas, aumentando os riscos de acidentes e adoecimentos no trabalho. Além disso, a definição de um piso salarial que não cobre os custos básicos operacionais transforma a promessa de melhor remuneração em mera ilusão. A remuneração proposta é tal que não apenas desrespeita o princípio de um salário minimamente digno, mas abre precedentes para um pagamento que pode efetivamente ser inferior ao mínimo legal por hora de trabalho à disposição das empresas.
Também é inaceitável a manutenção da possibilidade de exclusão unilateral dos trabalhadores/as/as das plataformas, sem mecanismos de defesa claros e justos, como a legislação do trabalho obriga. Tal medida evoca práticas disciplinares arcaicas, reminiscentes dos piores momentos da história do capitalismo industrial, agora revestidas com a aura de “modernidade” que a tecnologia mistificadoramente pretende proporcionar. O PL 12, então, é um retrocesso e um ataque frontal à legislação protetora do trabalho, uma vez que os/as motoristas estão completamente excluídos do conjunto de direitos do trabalho no Brasil, conquistados ao longo de muitas lutas da classe trabalhadora.
Neste manifesto convocamos à mobilização ampla contra a aprovação deste projeto de lei, exigindo a construção de marcos regulatórios que verdadeiramente respeitem e ampliem os direitos dos/as motoristas em aplicativos, em consonância com os direitos da classe trabalhadora brasileira, que, vale repetir, muito lutou para conquistá-los.
Assim, torna-se imperioso que legislações futuras atuem para garantir direitos trabalhistas adequados à realidade tecnológica contemporânea, visando sua melhoria, assegurando clara transparência dos comandos e decisões algorítmicas, de modo a criar mecanismos de fiscalização que protejam efetivamente os trabalhadores/as. O trabalho com direitos, na era digital, não é um ideal utópico, mas uma necessidade premente para a construção de uma sociedade que atenda aos interesses da maioria e não de uma minoria empresarial corporativa. Este é um chamado em prol da rejeição do PLP 12/2024 e da luta por uma legislação que coloque os direitos dos trabalhadores/as no centro das prioridades sociais, nessa era de expansão do trabalho digital. Que nossa voz coletiva ressoe nos corredores do poder e nas ruas, marcando a recusa em aceitar a precarização do trabalho como destino inexorável do progresso tecnológico.
Pessoas que já assinam
Luiza Erundina – Deputada Federal PSOL SP
Ricardo Antunes, Professor de Sociologia da UNICAMP
Vladimir Safatle, Professor de Filosofia da USP
Milton Temer, fundador do PSOL e membro do Diretório Nacional.
Virgínia Fontes, historiadora da UFF
Jorge Luiz Souto Maior, Professor da Faculdade de Direito da USP
Rodrigo Carelli, Professor de Direito do Trabalho da UFRJ
Graça Druck, Professora de Sociologia da UFBA
Ruy Braga, Professor de Sociologia da USP
Roberto Amaral, cientista político, ex-ministro da Ciência e Tecnologia
Valdete Souto Severo, Professora de Direito da UFRGS
Marco Aurélio Santana, Professor de Sociologia da UFRJ
Carlos Eduardo Martins, Professor de Ciência Política da UFRJ
Ricardo Festi, Professor de Sociologia da UNB
Claudia Mazzei Nogueira, Professora se Serviço Social da UNIFESP-SANTOS
Luci Praun – Professora de Sociologia da UFAC
Bruno Durães – Professor de Sociologia da UFRJ.
Carolina Catini – professora da Unicamp
Mariana Roncato, Pesquisadora da UNICAMP
Lawrence Estivalet – Professor de Direito da UFBA
Murillo van der Laan, Pesquisador da UNICAMP
Alexandre Fraga, Professor da UERJ
Maria Lucia Lopes da Silva, Professora da UnB
Marco Gonsales, Pesquisador da UNICAMP
Evilásio Salvador, Professor da UnB
Henrique Carneiro, Professor USP
Helena Martins, Professora UFC
Denise Gentil, Professora UFRJ
Gustavo Seferian, Presidente do ANDES -SN
Fabiano Dalto, Professor da UFPR
David Deccache, Diretor do IFFD
José Dari Krein, Professor UNICAMP e do CESIT
Luciana Genro, Presidenta da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco e Deputada Estadual do PSOL RS
Mariana Riscali, Diretora Executiva da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco
Sâmia Bomfim, Deputada Federal do PSOL SP
Fernanda Melchionna, Deputada Federal PSOL RS
Glauber Braga, Deputado Federal PSOL RJ
Fábio Félix, Deputado Distrital do PSOL DF
Prof Josemar Carvalho, Deputado Estadual PSOL RJ
Camila Valadão, Deputada Estadual PSOL ES
Monica Seixas do Movimento PRETAS, Deputada Estadual PSOL SP
Renato Roseno, Deputado Estadual PSOL CE
Roberto Robaina, Vereador PSOL Porto Alegre/RS
Luana Alves, Vereadora PSOL São Paulo/SP
Mariana Conti, Vereadora PSOL Campinas/SP
Bruna Biondi da Mulheres por mais Direitos, Vereadora PSOL São Caetano/SP
Juliana Curvelo do AtiVOZ, Vereadora PSOL Osasco/PSOL
Leandro Sartori, Vereador PSOL Itapira/SP
Jurandir Silva, vereador PSOL Pelotas/RS
Louise Santana da Mandata Coletiva Nossa Cara, Vereadora PSOL Fortaleza/CE
Vivi Reis, ex Deputada Federal PSOL/PA e Executiva Nacional do PSOL
Débora Camilo, Vereadora PSOL Santos/SP
Robério Paulino, Vereador PSOL Natal/RN
André Moreira, Vereador PSOL Vitória/ES